quarta-feira, outubro 31, 2012

A Fonte vai voltar a ser Luminosa


A Fonte monumental da Alameda D. Afonso Henriques, sem água e sem luz há cinco anos, vai voltar a ser luminosa em Novembro. A Fonte passou por obras de reabilitação, com vista a retomar os jogos de água. O sistema hidráulico já foi testado e funciona, disse fonte da Câmara à agência Lusa. Em acabamentos está agora a intervenção exterior com obras ao nível da estatuária.
 
Mais tarde - no que a Câmara estima que possa ser um espaço de tempo de 180 dias - o edifício da Fonte Luminosa será aberto ao público. O edifício será dotado de receção, uma galeria para exposições permanentes ou temporárias e um miradouro que permitirá ao visitante observar todo o complexo do funcionamento da Fonte.
A Fonte Luminosa - em tempos chamada O Lindo Efeito - foi inaugurada pelo Marechal Carmona em 1940, para comemorar a entrada das águas do Tejo na cidade de Lisboa. Há sete anos tinha passado por outras reparações, fechando dois anos depois. As obras agora ainda em curso são financiadas pelo Programa Prioritário em Ações de Reabilitação Urbana, que tem a singela sigla PIPARU.
Viva a Fonte Luminosa, viva!
E um grande PIPARU para todos os lisboetas!
 
Texto e fotos Becos das Barrelas / Direitos reservados.

terça-feira, outubro 30, 2012

Cinelândia em Lisboa

As autorizações para filmar em Lisboa são agora mais fáceis de obter. A CML acaba de criar a Lisboa Film Comission que visa simplificar todos os processos para filmar em Lisboa, publicidade ou cinema.
Este entusiasmo pelo apoio às filmagens em Lisboa tem várias fontes. Uma é que a Câmara faturou perto de 500 mil euros, entre Janeiro e Setembro, em taxas para filmar na cidade, publicidade ou filmes de enredo. Outra é que a produção do filme Comboio Noturno para Lisboa gastou em oito semanas na cidade mais de quatro milhões de euros em hotéis, transportes, catering, aluguer de equipamentos, contratação atores e de equipas técnicas, etc. E a ideia é que Lisboa ganhou lugar na cena cinematográfica: tem luz, sol, cenários únicos, ambiente cosmopolita.
O curioso é que a ideia de fazer de Lisboa e arredores um centro de produção europeu de cinema mundial já tem barbas. Entre Janeiro e Fevereiro de 1929, Reinaldo Ferreira, o célebre Repórter X, publicou na revista Ilustração uma série de reportagens ficcionadas sobre a Cinelândia da Europa: a ação, da reportagem datada de 1929, passava-se nos anos 40 e Reinaldo Ferreira imaginava uma Cinelândia que começara a ser construída entre Alcabideche, Sintra a Cascais, gozando da proximidade do Estoril e de Lisboa.
Mais curioso ainda é que nos anos 90, sem conhecer o texto de Reinaldo Ferreira, a Câmara de Cascais inscreveu no PDM espaço para construção de uma Cidade do Cinema: 170 hectares de terreno, a meia dúzia de quilómetros do local onde Reinaldo Ferreira imaginara a Cinelândia. E o projeto avançou, com apoio da Tóbis e da Luso-AM, que também desconheciam a história de Reinaldo Ferreira. Mas, como muitas outras boas ideias, esta também não saiu do papel.
Agora é Lisboa que entra na corrida. A cidade tem “luz a jorros”, como preconizava Reinaldo Ferreira na primeira receita para vingar na indústria do cinema. Falta saber se mais alguém se lembrará de “construir um hotel aéreo” onde “antes existia o elevador de Santa Justa”, para ajudar a “enlaçar Lisboa nas serpentinas imensas de celuloide”.


A tempo: “SÃO PAULO, SP, 13 de outubro (Folhapress) - Uma campanha no Facebook está tentando juntar dinheiro para ver o diretor norte-americano Woody Allen realizar um filme em Lisboa. A página "Woody Allen, queremos ver-te a filmar em Lisboa", que já tem quase cinco mil seguidores, está procurando ideias para fazer o sonho se tornar realidade. Informe-se aqui.

sexta-feira, outubro 26, 2012

O buraco está no mesmo sítio


Passados dez dias desde que se evidenciou pela quarta vez desde Julho, o buraco está no mesmo sítio e na mesma. Ou talvez esteja um pouco mais buraco e já com alguns detritos. O trânsito que desce a Avenida dos EUA, pouco após o entroncamento da Av. do Brasil, bifurca-se, ladeando pela esquerda ou pela direita o buraco. É opcional. Mas a verdade é que se gera uma pequena barafunda quando as três faixas da Avenida ficam de supetão e momentaneamente reduzidas a duas. Mas o que é uma pequena barafunda no trânsito de Lisboa? Quase coisa alguma.
Os leitores que se tenham detido na História de um buraco sabem que andamos nisto desde Julho: 4 meses para um buraco que se abre, fecha e reabre. O buraco tem dias. Abre. As autoridades competentes - para não dizer as competentes autoridades - tapam o buraco. O buraco resiste e reabre. E é assim que vão quatro. Só que, desta vez, as autoridades competentes, melhor dizendo os tapa-buracos, demoram a resgatar o buraco.
Estará a solução para o buraco à espera de um visto da Troika? Ninguém sabe ou não responde. O que se sabe é que o buraco continua no mesmo sítio. Há buracos assim, não há?

Texto e fotos Beco das Barrelas / Direitos reservados.

Leia também:

quinta-feira, outubro 25, 2012

O que faz falta é desassossegar a malta


Escrevo para desassossegar os meus leitores
José Saramago

A Fundação José Saramago instituiu o dia 16 de Novembro, data do nascimento do Nobel português da Literatura, como “Dia do Desassossego”. Celebra-se pela primeira vez no próximo 16 de Novembro, em que Saramago completaria 90 anos. Em simultâneo comemoram-se os 30 anos de primeira edição de “Memorial do Convento”.
No primeiro Dia do Desassossego estão já confirmadas as participações de Blimunda de Jesus, Ricardo Reis, Cão Ardent Constante, Jesus Cristo, a Mulher do Médico, Tertuliano Máximo Afonso, o elefante Salomão e muitos outros personagens da galeria do autor. Despertam particular curiosidade os encontros de Jesus Cristo e Ricardo Reis, dois ressuscitados, e do Cão da Jangada de Pedra com o Elefante. De resto, e a convite do pintor José Santa Bárbara, Baltazar, Frei Bartolomeu de Gusmão e até o Cão asseguraram lugares às janelas da Casa dos Bicos, sede da Fundação José Saramago, para assistir de palanque ao desassossego. Momento alto de todo o programa será Tertuliano Máximo Afonso, atuando a solo, a interpretar o dueto de O Homem Duplicado.
A Fundação convidou os leitores de Saramago a virem para a rua com os livros do autor, para os ler em voz alta, acenar com eles, exibi-los, partilhá-los, desassossegando a leitura e os leitores. A Fundação vai também editar um opúsculo que recolhe 90 palavras fundamentais na obra do escritor, escolhidas por leitores, através do site da Fundação.
O Desassossego transborda de Lisboa para Vila Real de Santo António, Huelva, Nova Iorque, New Jersey, Madrid, Porto, Londres, Santarém, o Mundo.
Mais informações aqui.
Texto de João Francisco. Fotos de Francisco João / Direitos reservados.

quarta-feira, outubro 24, 2012

Graças de Santa Engrácia - Prometemos ser breves, diz o Metro


As obras para prolongar o cais da estação de Metro do Areeiro - iniciadas em 2010 - sofreram novo adiamento. O atraso do alargamento do cais da estação do Areeiro do Metropolitano de Lisboa, que deveria ter ficado concluído em Agosto, determinou o adiamento do final das obras para… 2014. Os comboios de quatro carrguagens vão continuar a ser os únicos a poder circular na Linha Verde.
 



Como é uso e costume nas obras para o Estado, as autarquias, as empresas públicas, os prazos derraparam. Neste caso, uma obra iniciada em 2010, e com final previsto para 2012, ficou adiada sem explicações nem compensações, por mais dois anos, o dobro do tempo.
Os construtores em Portugal têm o dever de gratidão de elevar Santa Engrácia a Padroeira da Derrapagem
dos Prazos e Custos.
 

Texto e fotos Blogue das Barrelas / Direitos reservados

terça-feira, outubro 23, 2012

A calçada que "fala" português

…De cócoras, em linha os calceteiros,
Com lentidão, terrosos e grosseiros,
Calçam de lado a lado a longa rua.
Cesário Verde, Cristalizações

O calcetamento das ruas de Lisboa iniciou-se, timidamente, na passagem dos séculos XV para o XVI, por ordens régias de D. Manuel I. Mais tarde, a reconstituição da calçada não era certamente a prioridade na reconstrução de Lisboa, após o Terramoto de 1755. Mas no século XIX o governador de armas da Cidade determinou a pavimentação das áreas mais centrais de Lisboa, a partir do Rossio. A mão-de-obra utilizada foi de presidiários. É a esta calçada e a estes calceteiros que se refere o poema de Cesário Verde.
Um outro poeta, David Mourão-Ferreira, descreveu a geometria da calçada de Lisboa como, “sobre a ardósia do empedrado, curvas e rectas feitas a giz”.

A mestria que só se encontra em Portugal nesta matéria levou os mestres calceteiros portugueses a serem solicitados constantemente para dirigir a pavimentação com calçada portuguesa de ruas e praças nas colónias e no Brasil, como para ensinar o ofício de calceteiro por uma parte do mundo. No Rio de Janeiro há obras de calçada portuguesa de particular imponência, sendo a mais conhecida o Calçadão de Copacabana.
Ao contrário do que reza um dito popular, as pedrinhas da calçada não choram. Mas de algum modo “falam” português.

Texto e fotos Blogue das Barrelas / Direitos reservados

segunda-feira, outubro 22, 2012

Quentes e boas

Baixa
Por estes dias, em Lisboa, quem passa no Chiado ou no Marquês, no Rossio ou simplesmente quem sai do Centro Comercial das Amoreiras, na Praça da Figueira ou no Jardim da Estrela é envolvido e transportado pelo inebriante e indelével cheiro das castanhas assadas nas brasas. É um cheiro que cada português transporta desde a infância e que associa a adereços próprios da época do ano, desde a camisola de lã à mala ou mochila da escola. O cheiro das castanhas assadas viaja com cada um e desperta memórias associadas a esta época do ano e ao passar de cada vida. Assim sejam quentes e boas as memórias que o fumo e o cheiro das castanhas assadas despertam em cada um.

Avenida da Liberdade
As castanhas vêm do Oriente e do fundo da História, como pão de povos ancestrais. É um bom alimento, rico em hidratos de carbono mas com muito menos calorias que a generalidade dos frutos secos. A culinária pode dar-lhe os tratos que entender. Mas é “a estalarem cinzentas, na brasa” que elas melhor sabem e que dão calor e cheiro às nossas memórias. E por dois euros a dúzia, “leva mais calor para casa”.

Chiado
Para beber, jeropiga ou vinho abafado.

E para ouvir, é aqui mesmo. Palavras de José Carlos Ary dos Santos, música de Paulo de Carvalho, à guitarra António Chaínho, à viola José Maria Nóbrega e a voz de Carlos do Carmo.
 
Texto e fotos do Beco das Barrelas / Direitos reservados.

sábado, outubro 20, 2012

História de um buraco

Este não é um buraco qualquer, é um buraco com história. E por isso vem às páginas deste blogue dedicado a quem ama Lisboa.
A história deste buraco começa em Julho passado, na Avenida dos Estados Unidos da América, sentido descendente para a Av. Almirante Gago Coutinho, quase em frente do entroncamento da Rio de Janeiro e sensivelmente à porta da REN. Em Julho, o buraco manifestou-se através de um abatimento do piso da Avenida, de forma elítica e com cerca de um metro de comprimento. Ao fim de uns dias, o buraco foi cercado por uma vedação e remendado. Menos de duas semanas depois o buraco estava de novo a dar sinal de vida. E o tratamento do buraco repetiu-se.
No final de Agosto novo abatimento do piso já estava outra vez a tomar a forma de buraco. A terceira operação de resgate foi imponente e mais demorada, prolongando-se por Setembro. Grandes máquinas foram deslocadas para o local - e guardadas dia e noite por dois agentes da PSP - e entraram em ação. Do que se tratou, afinal, foi de dotar aquele troço da Avenida de novo tapete. E já que se estava com a mão na massa e nas máquinas, atapetaram-se as duas vias - descendente e ascendente - da Avenida dos EUA.
O buraco voltou a ser o que era a meio da terceira semana de Outubro. Aí está o buraco que agora já não é apenas um mas dois. O original é o que está fora da vedação.

Erro de diagnóstico? Erro de terapia? Em boa verdade, o buraco tem algumas semelhanças com o País e a crise.

Texto de João Francisco. Fotos do Beco das Barrelas / Direitos reservados

sexta-feira, outubro 19, 2012

Ninguém quer saber do Poeta

As pessoas passam e seguem. As pessoas sentam-se e viram as costas. Ninguém quer saber de um poeta de bronze que já fez toda a poesia que tinha para fazer, para ele próprio e para mais uns quantos heterónimos.
De maneira que só uma Ofélia balzaquiana, de vestido vermelho, encara o poeta, esperando talvez que lhe saia um poema da testa, ou uma carta do fundo de uma arca perdida no peito.
 
Meu amorzinho, meu Bebé querido:
Estou inteiramente só - pode dizer-se; pois aqui a gente, que realmente me tem tratado muito bem, é em todo o caso de cerimónia; não me faz, nem era de esperar, companhia nenhuma. E então parece-me que estou num deserto; estou com sede e não tenho quem me dê qualquer cousa a tomar; estou meio-doido com o isolamento em que me sinto e nem tenho quem ao menos vele um pouco aqui enquanto eu tentasse dormir.
“Estou cheio de frio, vou estender as pernas para fingir que repouso.
“Ai, meu amor, meu Bebé, minha bonequinha, quem te tivesse aqui! Muitos, muitos, muitos, muitos, muitos beijos do teu, sempre teu
Fernando
  
E o engenheiro Álvaro de Campos, que ia a passar, a caminho da Tabacaria, falando com os seus botões:
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.”
 
Texto João Francisco. Foto de Francisco João / Direitos reservados
Fernando Pessoa: caricatura de António na estação do Aeroporto do Metropolitano de Lisboa
 
Referências poéticas no Beco das Barrelas

quinta-feira, outubro 18, 2012

Memórias de pedra dos anos de chumbo


"Cuando tú desembarcas en Lisboa, // cielo celeste y rosa rosa, // estuco blanco y oro, // pétalos de ladrillo (…) no sabes que detrás de las ventanas // escuchan, // rondan  // carceleros de luto (…) la policía // bajo las otoñales cornucópias // buscando portugueses, // rascando el suelo, // destinando los hombres a la sombra."
Pablo Neruda / El Puerto Color de Cielo, 1953 *
 
O viajante que chega a Lisboa / Santa Apolónia depara, eventualmente, com uma lápide homenageando o “general sem medo”, Humberto Delgado, que ali desembarcou em 16 de Maio de 1958, sendo esperado por “milhares de pessoas”.
Se o viajante visitar a Sé de Lisboa, e da Sé subir para os miradouros de Santa Luzia ou das Portas do Sol, vai possivelmente dar por um edifício austero com grades sinistras onde outrora, “do silêncio das ‘gavetas’  da Pátria amordaçada (…) subiu o clamor da liberdade e floriu Abril”.
Se visitar o Chiado e seguir para a baixa pela Rua António Maria Cardoso, poderá, se for muito perspicaz, vislumbrar uma inscrição na parede de um condomínio de luxo, que reza que ali, “na tarde de 25 de Abril de 1974, a PIDE abriu fogo sobre o povo de Lisboa e matou”.

Na estação de Santa Apolónia, no Aljube, na antiga sede da PIDE (foto à direita) há memórias de pedra dos anos de chumbo. Como no Alto de São João há o monumento que honra os mortos do Tarrafal. Ou, nos Prazeres, o túmulo do capitão Henrique Galvão reza que “quando a ditadura é um facto a revolução é um direito”.
A memória dos portugueses não foi para a cova. Está gravada em pedra para que dure.
Texto João Francisco. Fotos Francisco João / Direitos reservados.

* Leia o poema de Pablo Neruda La Lámpara Marina na íntegra aqui no blogue Absorto, editado por Eduardo Graça.

quarta-feira, outubro 17, 2012

Ler Lisboa

Perfilados ao alcance da mão, de um lado da mesa de trabalho, acumulam-se livros sobre Lisboa que complementam o trabalho de rua e acompanham e ensinam nesta modesta mas empenhada missão de conhecer e dar a conhecer a cidade das nossas vidas.
Lá estão as imprescindíveis "Peregrinações em Lisboa", de Norberto de Araújo. Lá está um álbum precioso, a “Memória de Lisboa”, de Rómulo de Carvalho (António Gedeão), com fotos, legendas e observações do estimado professor e grande poeta. Lá está a “Biografia de Lisboa”, da historiadora Magda Pinheiro. Lá estão deambulações por Lisboa de José Cardoso Pires, “Lisboa - Livro de Bordo”, e de Alice Vieira, “Esta Lisboa”, com fotos de António Pedro Ferreira. Lá está também uma pequena e modesta edição em castelhano de “Lo que el turista debe ver” em Lisboa, o guia turístico de Fernando Pessoa publicado em Portugal só nos anos 90.
 
Lá está poesia, sempre incompleta - entre outros, Cesário, Álvaro de Campos, O’Neill, Cesariny, Ary dos Santos, José Gomes Ferreira e Sophia que, não sendo de Lisboa, escreveram das palavras mais belas sobre a cidade. E lá estão algumas obras de ficção, com Lisboa por cenário ou como protagonista - contos de José Rodrigues Miguéis, romances de Eça, Abelaira, Baptista-Bastos, Saramago, Dinis Machado, António Tabucchi.
E lá estão alguns livros de jornalistas sobre Lisboa. “O poço da Cidade”, de Ápio Sottomayor; alguns volumes da “Lisboa Desaparecida”, de Marina Tavares Dias; o “Chiado: o peso da memória”, de António Valdemar.
Mas há um livro que transita da mesa de trabalho para a mesa-de-cabeceira porque nas suas páginas, mais que a cidade, as ruas, as vielas, os becos, as escadinhas, as casas, é o povo de Lisboa que ali revive. Falo do livro de crónicas de Armando Baptista-Bastos “Lisboa contada pelos dedos”, Grande Prémio de Crónica da Associação Portuguesa de Escritores:
 
Todos os dias te caminho, todos os dias te passeio, todos os dias te olho, nem todos os dias te vejo”.

Consulte aqui um interessante catálogo temático de livros sobre Lisboa.
 
Texto João Francisco. Foto Francisco João / Direitos reservados.

terça-feira, outubro 16, 2012

Sueca nos jardins de Lisboa

Quem baralha? Quem parte? Quem dá? Trunfo por baixo ou por cima? Quem sai? A quem é que só saem duques e senas tristes? Quem tem uma manilha seca? Quem manda recados ao parceiro pelas cartas que joga? Quem faz sinais disfarçados? Quem assiste? Quem balda? Quem corta? Quem corta e balda? Quem faz passagens? Quem faz uma renúncia? Quem faz batota? Quem leva as cartas contadas? Quem livrou? Quem ganhou? Quem perdeu? Por um? Por dois? Por quatro? Quem empata? 
 
Nos jardins da cidade, o jogo da Sueca é certamente a mais frequente e animada atividade social, sobretudo por parte da população masculina mais idosa que joga ou que assiste e discute depois cada jogo e cada jogada. Sendo que, durante o jogo, “quem está fora não racha lenha”. Mas para além do convívio e da competição, os jogos de cartas trazem vários benefícios para a saúde física e psicológica. É o que diz o Departamento de Psicologia da Universidade de Southampton.
 Uma partida de Sueca serve como um estímulo para o cérebro, ajudando a exercitar a memória, a organizar a atividade mental e a lidar com situações inesperadas, o que habilita os jogadores a lidar com possíveis dilemas da vida, sobretudo na terceira idade.
E então? Quem baralha? Quem parte? Quem dá?
E, já agora, só uma pergunta de algibeira para os jogadores: qual é o único rei do baralho de cartas que não tem bigode? 
Mais informações, regras, torneios, curiosidades no blogue Cartadas.

Tetxo e fotos Beco das Barrelas / Direitos reservados.

segunda-feira, outubro 15, 2012

A Praça dos 87 arcos

Em 16 de Janeiro de 1758, “com a rubrica de Sua Magestade” (com g no original), D. José I, e porque lhe fora “suplicado” pelos seus “vassalos”, fez publicar o decreto decidindo “a construção de uma praça digna da capital do reino e com a comodidade necessária para nela se instalarem os comerciantes”. “Sou servido que logo se proceda às referidas obras…”, lavrou D. José. E assim nasceu a Praça do Comércio, desse modo designada pelo Marquês de Pombal. Terreiro do Paço chamou-se depois, quando a residência real foi transferida para o Paço da Ribeira, junto ao rio.
O projeto da Praça foi da autoria de Eugénio dos Santos, sob a responsabilidade direta do Marquês. A Praça ficou a abrir-se para a Baixa da Cidade pelas ruas do Ouro e da Prata e pelo Arco da Rua Augusta, desaguando para o Tejo pelo Cais das Colunas. Ao centro, Sua Majestade. Os arcos das Arcadas das três alas do Terreiro são 86. Com o da Rua Augusta 87. Há uma interpretação cabalística para os números e a geometria de todo este espaço público.
Muita história correu sob as Arcadas e no Terreiro. Num dos acessos à Praça deu-se o Regicídio (1908) e ali tiveram lugar os primeiros enfrentamentos na manhã de 25 de Abril (1974). Houve um tempo em que Arcada era sinónimo de poder. Notícias da Arcada, correspondentes na Arcada, uma fonte da Arcada davam as novidades permitidas e rateadas da governação. Também foi a Praça dos heróis, dos mutilados, das viúvas e dos órfãos das guerras coloniais. E foi a Praça onde o almirante Pinheiro de Azevedo proclamou em 1975 que "o povo é sereno" e "fumaça" é "só fumaça".
Até que, já no século XXI, o Terreiro se libertou e ganhou foros de Praça. A Praça trocou serviços de ministérios por zonas de lazer e esplanadas, embora alguns gabinetes do Governo ainda estejam instalados nas Arcadas. O bicentenário Martinho da Arcada já não está sozinho: há mais uma dezena de restaurantes, cervejarias e cafés na Praça. Mas não há só o lazer. O Lisboa Story Centre, promete ser um centro de interpretação interativa das memórias da história lisboeta.

Texto de João Francisco. Fotos de Francisco João. Direitos reservados.

Ver também:

sexta-feira, outubro 12, 2012

Lisboa não arranha os céus

Excluindo pontes e torres de telecomunicações, a edificação mais alta de Lisboa é a Torre Vasco da Gama, com 145 metros de altura. Na segunda posição, com 100 metros, está o Hotel Sheraton, construído no início da década de 70 do século passado. Era o "arranha-céus" do antigamente. Mesmo as pontes não vão acima dos 190 metros (25 de Abril) ou dos 155 (Vasco da Gama). E a torre do Teleférico do Parque das Nações eleva-se a 80 metros de altitude.
De resto, as Twin Towers andam pelos 90 metros, tal como os edifícios Panoramic ou Écran. Já o Espírito Santo Viagens, o Tivoli Tejo e o Alfa Lisboa andam na casa dos 80 metros. E o velho edifício do Ministério do Trabalho não passa dos 85 metros, mais 10 metros que qualquer uma das Torres das Amoreiras.
O futuro não será assim. Já se discutem propostas para edificações de mais de 300 metros e até de um edifício com mil metros e 200 andares. Mas isso só quando o aeroporto sair da cidade.

Texto e foto Blogue das Barrelas / Direitos reservados

quinta-feira, outubro 11, 2012

A multiplicação dos pães

Ao fim de tarde de uma quarta-feira, 29 de Fevereiro passado, a Livraria Portugal, na Rua do Carmo, em Lisboa, vendeu uma gramática de Língua Portuguesa a uma professora radicada em França e depois fechou as portas para sempre. A Portugal não era um cemitério de livros esquecidos. Fez o seu caminho e a sua história de 70 anos ao vivo, em tertúlias onde se reuniam e dissertavam grandes figuras do pensamento. Nos últimos anos, as estantes de História da Livraria Portugal eram de procura obrigatória para os interessados.
 
Mas o Mercado - profeta do deus Dinheiro - tem destas coisas. E, libertadas as belíssimas instalações da Livraria Portugal - 300 m2 em dois pisos -, o Mercado pôs-se em campo. De tal maneira que, há pouco mais de um mês abriu nas antigas instalações da Livraria Portugal uma padaria. O Mercado reuniu os seus discípulos e transformou os livros em pão. Ou melhor dizendo, em brioches, que foi o que Maria Antonieta aconselhou os franceses do seu tempo a comerem quando lhes faltasse o pão. Brioches, baguetes, croissants, há de quase tudo na segunda padaria da cadeia francesa Eric Kayser, em Lisboa. 

Texto e foto Blogue das Barrelas / Direitos reservados

quarta-feira, outubro 10, 2012

Lisboa e os Corvos

“São Vicente, para ser São Vicente e entrar na História como entrou, teve necessidade de dois corvos para o acompanhar que, por sinal, lhe foram sempre fiéis até hoje
José Cardoso Pires, A República dos Corvos

Foi por via da lenda que os corvos entraram na pedra de armas de Lisboa. São Vicente foi um sacerdote presumivelmente natural de Saragoça, martirizado em Valência no tempo do imperador romano Diocleciano, no século IV. Os seus despojos, lançados ao mar, terão sido sempre acompanhados por dois corvos até ao extremo sudoeste da Península, desde então denominado Cabo de São Vicente. No local terá existido um santuário moçárabe. E daí os restos mortais terão sido resgatados e mandados para Lisboa, por ordem de D. Afonso Henriques, em 1.176. Na Sé de Lisboa jazem num ossário de prata, restos mortais identificados como sendo os de São Vicente.
As mais antigas representações dos corvos nas pedras de armas de Lisboa estão num documento do Mosteiro de Santos-o-Novo, de 1271, e num baixo-relevo de um chafariz situado no Largo do Andaluz, em Lisboa, datado de 1336 (foto da direita), muito mal conservado e em situação de total insegurança. Os corvos estão no frontão da fachada da Câmara de Lisboa, entre as figuras do Amor à Pátria e da Liberdade (foto da esquerda).
 
E a partir daí o povo é soberano, livre e sereno. Em Lisboa há uma rua dos Corvos, em Santo Estevão, Alfama, e um Pátio dos Corvos também conhecido por Pátio da Sé; um restaurante Os Corvos, na Graça, e um outro, Barca dos Corvos, no Campo das Cebolas; há uma União Desportiva Corvos XXI, registada na Charneca da Caparica mas com instalações em Lisboa, onde pratica futsal, e um Sport Benfica Corvense, que será como que uma embaixada da Águia na Rua dos Corvos.
 
E tudo começou com uma lenda.
Mas quanto a corvos propriamente ditos estão a desparecer.

Texto e fotos Blogue das Barrelas / Direitos reservados.

terça-feira, outubro 09, 2012

D. José primeiro de bronze


Há quem diga que não, que a estátua equestre da autoria de Machado de Castro não representa D. José I mas sim São Jorge de Portugal, Vigilante da Pátria Lusitana. A estátua está ao centro da Praça do Comércio - assim chamada pelo Marquês de Pombal e que os republicanos passaram a designar por Terreiro ao Paço. Fundida em bronze, a figura central da estátua, trajando à romana e empunhando o ceptro real, olha o Tejo do alto da sua soberba montada: um cavalo também em bronze, cuja pata direita é a esquerda, como se conta numa adivinha lisboeta.
Pois há quem diga que não é D. José, como há quem diga que no Rossio está um imperador mexicano e não D. Pedro IV. Há quem tenha e defenda uma leitura esotérica de toda a arquitetura da Baixa de Lisboa. Mas, para efeitos práticos, a estátua da Praça do Comércio desde 6 de Junho de 1775 é de José Francisco António Inácio Norberto Agostinho de Bragança, quinto rei da quarta dinastia com o nome de D. José I, o Reformador. O que nem sempre figurou na estátua foi o medalhão com a efígie do Marquês de Pombal, retirado do seu lugar por Dona Maria I e reposto por Dina Maria II.
O que está fora de discussão é que a estátua é belíssima. E muito mais bela agora que a sua beleza emerge de um vastíssimo terreiro para uso dos cidadãos. Foi a primeira estátua fundida em bronze em Portugal, no Arsenal do Exército. Mede cerca de sete metros, pesa cerca de 30 mil quilos e assenta sobre um pedestal de pedra lioz de Pero Pinheiro, entre figurações simbólicas do Triunfo e da Fama.

Texto de João Francisco. Fotos de Francisco João / Direitos reservados.

segunda-feira, outubro 08, 2012

O Fado da crise

O setor da restauração é dos mais afetados pela crise: os custos das matérias-primas, os encargos gerais - eletricidade, gás, água, rendas, pessoal - e os impostos, em particular o IVA a 23 por cento, têm levado à insolvência milhares de estabelecimentos, como também milhares de trabalhadores ao desemprego.
Agora é que se vê quem tem unhas para tocar a guitarra da imaginação e atrair uma clientela cada vez mais reduzida, pois a crise também está a alterar grandemente os hábitos de consumo da população. Já aqui falámos dos minipratos do Martinho da Arcada, agora trazemos o exemplo do Café Nicola.
Fundado no final do século XVIII, era então conhecido por Academia, dada a frequência intelectual das suas mesas. Café literário, café com história, o Nicola - hoje Café Restaurante Nicola - chegou a ser famoso pelo seu bife, o Bife à Nicola.
Mas a crise não se compadece com a história e hoje o Nicola, para atrair clientela, sobretudo a clientela estrangeira que sempre visita Lisboa e frequenta o Rossio, passou a ter fados e guitarradas, de quinta a domingo.
É a crise, é o fado. De tal maneira que já há quem cite uma quadra atribuível a Manuel Maria Barbosa du Bocage,
Elmano Sadino, poeta e assíduo
frequentador do Nicola:
 
Sou o Bocage do Sado
E vou ao Café Nicola
Para ouvir cantar o fado
À guitarra e à viola.
 
Ver também:
Da Mensagem ao miniprato
 
Texto e Fotos do Blogue das Barrelas / Direitos reservados.

sábado, outubro 06, 2012

Marquês com vista para o Tejo

  
Quando levantou o nevoeiro, o Marquês pôde apreciar a cidade, dois séculos depois da reconstrução. A princípio custou-lhe distinguir o traçado da Baixa da cidade que o arquiteto Eugénio dos Santos reconstruiu sob a sua direção. Havia elementos novos que confundiam profundamente o desenho original e a paisagem circundante, como fossem os edifícios muito altos, que cortavam a vista e a própria luz do Sol, e os chamados automóveis, uma torrente movediça como lava que escoava com dificuldade pelo traçado das ruas. Olha se o Marquês não tivesse previsto avenidas largas? Depois foi identificando os contornos e lá estavam, com efeito, as avenidas estruturantes, onde antes existiam os Becos da Bofetada, da Comédia, do Espera-me Rapaz, do Urinol, o Pátio do Esnoga, a Rua do Chancudo ou a do Pocinho Entre as Hortas. “Porca miséria”, exclamara o Marquês, como se dizia, no seu tempo, nos reinos da Sardenha, Lombardia, Nápoles, entre outros. Sim, lá estavam as ruas Augusta, do Ouro e da Prata, as réguas do desenho pombalino. E ao fundo da Rua Augusta, por baixo do Arco do Triunfo, o Senhor Rei Fidelíssimo D. José I, a cavalo. Uma estampa de estatuária. O Marquês não sabe que o medalhão de bronze que o representa e figura na estátua nem sempre lá esteve. Nem convém dizer-lhe.
 
O Marquês revisita Lisboa, olhando a Baixa de cima do seu pedestal na rotunda com o seu nome, e vendo o rio Tejo para lá da Lisboa reconstruída. E apesar de tudo, gostou do que viu. Principalmente da vista para o Tejo.   

Texto de João Francisco. Fotos de Francisco João / Direitos reservados.

Sobre o Marquês veja também:
 

sexta-feira, outubro 05, 2012

Liberdade, Igualdade, Independência, Luz

Na Rotunda, pelas 3 horas da manhã de 4 de Outubro de 1910, quando Machado Santos assumiu o comando das forças revoltosas - militares republicanos e civis armados - recebeu um juramento dos homens que ocupavam as barricadas: “Nós morremos aqui ao lado de Vossa Senhoria”. O combate era desigual: não mais de 400 revoltosos contra mais de oito mil soldados e polícias obedientes ao Estado-Maior monárquico. Mas às quatro da tarde, as forças monárquicas retiravam-se de Sete Rios. E os republicanos tomavam a iniciativa. Dispunham de oito peças de artilharia com as quais bombardearam o Palácio das Necessidades. A alteração de forças e de posições dava-se a cada hora. E quando os monárquicos começaram a bombardear a Rotunda, a partir do pátio do Torel, atingindo as ameias e torres da Penitenciária de Lisboa (na foto pequena), os republicanos bombardearam o Rossio, onde as forças monárquicas se concentravam para o assalto às barricadas da Rotunda. Ao mesmo tempo, forças das Armada desembarcavam na Baixa em apoio da República, a corte fugia e importantes unidades controladas pelos monárquicos desertavam em massa.
E foi assim que às 11 horas da manhã de 5 de Outubro de 1910 foi possível a dirigentes do Partido Republicano proclamarem na varanda dos Paços do Concelho de Lisboa: “Unidos todos numa mesma aspiração ideal, o Povo, o Exército e a Armada acabaram de proclamar a República em Portugal.”
Nos dias seguintes, de Lisboa para todo o País, a proclamação seguiu pelo telégrafo: “A República é, no Estado, liberdade; na indústria, produção; no trabalho, segurança; na nação, força e independência. Para todos, riqueza; para todos, igualdade; para todos, luz."
 
Na véspera, antes mesmo da proclamação, já “um bando de miúdos andava pelas ruas de Lisboa, de bandeira em punho, a bandeira vermelha e verde da Revolução feita em papel de seda, onde colara, em letras recortadas, um Viva a República”. O poeta José Gomes Ferreira, um desses miúdos, tinha 10 anos em 1910, nascera com o século.

Citação de José Gomes Ferreira in A Memória das Palavras, ou O Gosto de Falar de Mim, 1965 
Texto de João Francisco. Fotos de Francisco João /Direitos reservados.



5 de Outubro (1910 - 2012)